Ver de cima

Por Dom José Alberto Moura, Arcebispo de Montes Claros (MG)

Quanto mais em cima estivermos enxergamos mais amplamente tudo, se nossa vista estiver boa. Quanto mais fechada em si mesma e com a visão ofuscada, menos a pessoa tem noção adequada da realidade a seu redor. Por isso, a perspectiva de vida com seu sentido torna-se mais abrangente para quem olha a existência com a visão total da mesma.

Jesus, do alto da cruz pode olhar compassivo para nós e derramou todo o seu sangue para nos regenerar da visão e prática egoísta da vida. Após a ressurreição Ele se elevou para junto do Pai, com o olhar redentor para conosco, sendo nosso grande intercessor perante o agora também nosso Pai, conforme Ele nos ensina no Pai Nosso. Mas para termos o direito de estarmos junto a Deus um dia na eternidade, precisamos também ter o olhar dele, buscando o que é do alto, ou seja, uma vida que é regida não pela carne ou o egoísmo, e sim pelo Espírito ou o amor. Ele cura nossa visão e nos coloca em posição elevada para vislumbrarmos a vida com a luz da misericórdia, da justiça e da fraternidade. Afinal, Ele não veio à nossa pequenez à toa. Ergue-nos na visão da caminhada terrena para assumirmos nossos passos para a construção da história humana com o olhar divinizado.

Antes da ascensão ao céu Jesus deu as últimas instruções aos discípulos e lhes assegurou a vinda do Espírito Santo, que dá robustez à fé dos mesmos. Deste modo eles cumprirão a missão deixada pelo Mestre: “Recebereis o poder do Espírito Santo, que descerá sobre vós para serdes minhas testemunhas em Jerusalém, em toda a Judéia e na Samaria e até os confins da terra” (Atos 1, 8). A vida terrena nos dá o mérito da vida eterna feliz se cumprirmos aqui nosso dever de casa, ou seja, seguindo os passos do Filho de Deus, imitando-o e propagando seus ensinamentos aos outros. Não podemos ficar de braços cruzados. Precisamos colocar a mão na massa, através do uso dos dons de Deus para colocá-los a serviço da construção da convivência na promoção da vida e da dignidade humana, promovendo a vida de todos com verdadeira humanização. Deus quer a vida terrena boa para todos. Mas cada um deve dar de si para que isso vá progressivamente acontecendo, mesmo à custa do sacrifício de si, como o próprio Cristo fez exemplarmente.

Paulo lembra o poder de Jesus, que “colocou tudo sob os seus pés” (Efésios 1, 22), ou seja, Ele implantou aqui seu Reino, em que seu amor e seus valores ou critérios superam os poderes humanos, que, por si, não têm força para promover totalmente a dignidade humana, que precisa do amor de Deus para sua transformação. Ele está acima de qualquer poder humano, pois é o Filho de Deus. Com Ele, e seguindo seus ensinamentos, somos capazes de fazer reinar a justiça na terra, em que todos sejam tratados como filhos de Deus. Haverá uma visão ampla da vida, em que a pessoa humana é tratada realmente como imagem e semelhança divina. Como Deus criou tudo e cuida maravilhosamente do universo, o ser humano é chamado a ter a visão abrangente e cuidar da terra de modo amoroso e carinhoso. Só com esse olhar amplo é que o problema humano existencial tem solução benéfica para todos. Com o amor divino somos capazes de humanizar a face da terra.